Antonio Corrêa de Lacerda*
A valorização cambial é o principal problema de curto prazo da economia brasileira. O câmbio é um dos principais preços da economia. Uma vez distorcido causa, entre outros efeitos, a desestruturação da produção no País. Há muito destaque quanto aos efeitos do câmbio sobre o setor exportador. Mas, na verdade, ao definir preços, a taxa de câmbio é uma variável-chave de todo o setor produtivo. Sempre que a taxa de câmbio estiver desalinhada, como ocorre atualmente, há um claro desestímulo à exportação, mas também à produção local, aos investimentos, à geração de emprego e renda, na medida em que a importação é incentivada.
Um dos argumentos dos que defendem o aparente benefício da valorização cambial é que ela proporciona o barateamento da compra de máquinas e equipamentos para a modernização industrial. De fato, se observarmos o crescimento do quantum importado de bens de capital nos 12 meses até fevereiro, de 24,4%, isso poderia levar a uma conclusão equivocada de que estaria havendo uma forte retomada de investimentos e que, portanto, o processo seria saudável.
No entanto, o que claramente está ocorrendo é a substituição de produção local por importações, processo que ocorre também entre os bens de capital. A produção de bens de capital no mesmo período cresceu bem menos do que a importação: 6,7%. A indústria de transformação, por exemplo, que é a parcela da produção que tende a ter maior valor agregado, vem crescendo abaixo do produto. Depois da revisão dos números de 2006, por exemplo, para um Produto Interno Bruto (PIB) de 3,7%, a indústria de transformação cresceu apenas 1,6%.
Primeiro é preciso lembrar que, mesmo que fosse verdade que a valorização cambial estimula a modernização, esse não é o instrumento mais adequado para isso. É mais ou menos como jogar a criança junto com a água suja do banho.
Pelo contrário, a maioria dos países desenvolvidos utiliza o câmbio desvalorizado como fator de competitividade. O instrumento mais adequado para estimular a modernização industrial é a concessão de isenções tributárias e incentivos, por prazo determinado, sempre no âmbito de uma política industrial. Esses instrumentos associados a formas competitivas de financiamentos podem incentivar a modernização, sem os malefícios do desalinho cambial, que prejudica toda a cadeia produtiva.
Vale também lembrar que o maior motivador de investimentos, seja em modernização, seja em ampliação da capacidade produtiva, é a percepção, por parte do empresário, do crescimento do mercado interno e da exportação. Nesse sentido, um câmbio desalinhado é um desincentivo ao investimento. No mercado interno, pela crescente concorrência de produtos importados, e no mercado externo, pela perda de competitividade e rentabilidade na exportação.
Há quem evoque indevidamente a visão schumpeteriana de "destruição criativa" para descrever o que está ocorrendo com a eliminação de cadeias produtivas no Brasil, por causa da valorização cambial e das desvantagens competitivas dos fatores de competitividade sistêmica. Trata-se evidentemente de um equívoco. A "destruição criadora" ocorre pelo avanço das inovações, mas pressupõe fatores de competitividade (câmbio, juros, tributos, logística, infra-estrutura, etc.) alinhados com a média internacional.
Os arautos do câmbio de mercado também alegam que faltam propostas concretas para reverter o quadro. Também tentam desqualificar o argumento da necessidade da queda dos juros, alegando que estes já caíram 7 pontos porcentuais, mas o câmbio continuou se valorizando. Ocorre que o juro real, que é o que de fato conta, apesar das quedas, ainda está em 8,5% ao ano, cerca de quatro vezes a média internacional. Esse é um fator importante estimulador de arbitragem.
Portanto, uma redução mais forte da taxa de juros seria importante fator de correção do câmbio. O que poderia ser complementado com o aprimoramento da atuação do Banco Central nos mercados (à vista e futuro) e ainda com o uso de outros instrumentos tributários e regras de transações. Portanto, há sim saídas, desde que se queira de fato mudar o quadro atual. O imobilismo está custando e vai custar muito mais caro.
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