quarta-feira, 30 de março de 2011

LAVAGEM DE DINHEIRO E SEUS PERIGOS

UM POUCO DE HISTORIA
Segundo alguns a lavagem de dinheiro nasceu na China de 3000 anos atrás, quando mercadores adoptavam, para proteger os próprios patrimónios das garras dos governantes da época, técnicas muito parecidas ás usadas hoje pelos lavadores.
Segundo outra escola o termo "lavagem de dinheiro" deriva do facto que nos anos '20 e '30 os gangsters mafiosos americanos (entre os quais o famoso Al Capone) tinham o hábito de reciclar o dinheiro em espécie, que recebiam do contrabando, prostituição, jogo ilegal e extorsão, através de redes de lavanderias (mas também de caça níqueis) que eram usadas para justificar uma origem "lícita" para o dinheiro.
A minha opinião pessoal (compartilhada por muitos) é que na realidade o termo "lavagem de dinheiro" derive do facto que é a operação de transformar dinheiro ilícito (ou sujo) em dinheiro lícito (ou limpo) evoca o processo geral de lavagem que, simplesmente, é a transformação de algo sujo em algo limpo.
O crime de "lavagem de dinheiro" começou a ser configurado só nos anos '80, no âmbito do combate aos narcotraficantes. O FATF-GAFI (Financial Action Task Force on Money Laundering), um dos principais organismos internacionais de referência no combate à lavagem de dinheiro, e o principal agente de integração e coordenação das políticas internacionais neste sentido, foi criado em 1989 por iniciativa dos paises do G-7 e da União Européia.
A TEORIA GERAL
A lavagem de dinheiro é aquele conjunto de processos, operações e actividades que visam transformar dinheiro de origem ilícita, e portanto de difícil aproveitamento, em dinheiro ou patrimónios com uma origem aparentemente lícita, e portanto facilmente aproveitáveis.
A lavagem de dinheiro não é um acto simples mas um processo que se compõe básicamente de três etapas. Por vezes as três etapas podem ser resolvidas numa única transação mas é normalmente mais provável que apareçam em formas bem separadas, uma por cada vez e ao longo de um certo periodo de tempo. As etapas são:
  • Colocação.
  • Estractificação, Difusão ou Camuflagem.
  • Integração.
Os pontos considerados mais sensíveis e delicados no processo de lavagem do dinheiro são normalmente os seguintes:
  • Entrada do dinheiro em espécie no sistema financeiro (a etapa da colocação).
  • Transferências, tanto dentro como fora do sistema financeiro.
  • Fluxos de dinheiro entre diferentes países.

Estes são normalmente os momentos nos quais os lavadores se encontram mais expostos e vulneráveis e por isso as autoridades do mundo inteiro, em graus diferentes de intensidade e eficiência, tentam concentrar-se no combate à lavagem de dinheiro partindo destes pontos de fraqueza.
As empresas também deveriam levar em conta estes pontos de fraqueza no processo de lavagem de dinheiro no momento de implantarem procedimentos e sistemas de monitorização antí-lavagem.
Por sua vez, os lavadores de dinheiro concentram grande parte de seus esforços na busca e/ou criação de justificativos, meios, coberturas e disfarces para que as operações deles não apareçam suspeitas e não sejam detectadas, sobretudo no momento em que forem sujeitas aos pontos de exposição e fraqueza acima indicados. Por exemplo o uso de um restaurante ou comércio para justificar relevantes depósitos bancários em dinheiro é um disfarce para tentar reduzir o risco no ponto fraco da entrada do dinheiro no sistema financeiro ... assim como o uso de uma operação de trading internacional para transferir dinheiro de um país para outro é um justificativo para tentar encobrir o ponto fraco de uma transferência internacional dentro do sistema financeiro e/ou de um fluxo entre paises ... etc.
Existem factores comuns a todas as operações de lavagem de dinheiro.
 
Três destes factores, que se identificam em práticamente todas as operações, são:
  • a necessidade de ocultar a origem e o verdadeiro dono do capital.
  • a necessidade de manter sempre o controle do capital.
  • a necessidade de mudar rápidamente a forma do capital para poder enxugar o grande volume de dinheiro gerado da actividade criminal de origem. 
    AS ETAPAS DA LAVAGEM

    1) COLOCAÇÃO
    Este é o primeiro passo do processo. A lavagem é uma actividade que lida com muito dinheiro em espécie, gerado por actividades ilícitas como, por exemplo, a venda de drogas nas ruas. Este dinheiro é colocado no sistema financeiro ou na economia de mercado ou ainda é contrabandeado fora do pais de origem. A necessidade primária dos lavadores é de remover o dinheiro do seu local de aquisição, para limitar o perigo que as autoridades detectem a actividade que o gerou, e depois transformar este dinheiro noutras formas como traveller cheques, cheques correio, títulos ao portador, saldo em contas correntes, bens de alto valor, obras de arte etc...
    O objectivo final desta etapa é fazer com que o dinheiro em espécie seja transformado noutra forma de valor, preferencialmente em depósito numa conta bancária ou outro activo financeiro líquido, para que possa passar à fase seguinte do processo de lavagem.
    2) ESTRACTIFICAÇÃO, DIFUSÃO ou CAMUFLAGEM
    Com a estractificação, difusão ou camuflagem, há a primeira tentativa de encobrimento ou disfarce profundo da fonte do dinheiro criando camadas complexas de transacções financeiras e/ou comerciais projectadas para disfarçar o rasto de origem e promover anonimato. O propósito da camuflagem ou estractificação é de desassociar o dinheiro ilegal da fonte do crime, criando uma teia complexa de transacções financeiras e/ou comerciais com o propósito de dificultar a identificação de qualquer rasto por parte de investigadores e caçadores e ao mesmo tempo esconder a verdadeira fonte e propriedade dos fundos e criar uma nova justificação "limpa" para a origem dos mesmos.
    Tipicamente "camadas de camuflagem" são criadas transferindo, por meio de transferências eletrónicas, o dinheiro dentro e fora de contas bancarias off-shore abertas, em países diferentes, em nome de sociedades de fachada com acções ao portador. Dado que há mais de 500,000 operações de transferência eletrónica por dia - representando mais de USD 1 trilião - a nível mundial, a grande maioria das quais legítimas, não é possível (ou pelo menos não é nada fácil) distinguir as transações que envolvem dinheiro de origem ilícita das outras. Isso fornece um meio eficiente para que os lavadores movimentem o dinheiro sujo. Outras formas usadas pelos lavadores são procedimentos complexos com acções, commodities e futuros. Dado o volume global de transacções diárias, e o alto grau de anonimato frequentemente disponível, as possibilidades que as transacções sejam localizadas é muito pequena quando não insignificante.
    Os lavadores têm ainda a possibilidade de utilizar determinadas operações comerciais (compra e venda de produtos entre países diferentes) nas etapas de camuflagem, este ultimo sistema com suas numerosas variantes parece estar na moda actualmente. Uma destas variantes merece menção por representar uma tendência em ascensão. Uma empresa ou entidade estrangeira contacta uma industria, comerciante ou trader (muitas vezes de commodities) e fecha um grande contracto de compra com relativo pagamento á vista (vindo de um paraíso fiscal), sucessivamente, e conforme cláusula prevista no contracto, esta empresa resolve anular a compra e pede a devolução do pagamento, menos eventuais multas, para outra conta num país "não suspeito". Como variante a empresa simplesmente cede/vende com alguma dedução ao contracto de compra (em vez de anulá-lo com multa) para um operador do sector, tipicamente em países do primeiro mundo, recebendo o pagamento relativo via banco em "país não suspeito".
    3) INTEGRAÇÃO
    A fase final do processo, frequentemente interligada ou ás vezes sobreposta á etapa anterior. É nesta fase que o dinheiro é definitivamente integrado no sistema económico e financeiro e é assimilado com todos os outros activos existentes no sistema. A integração do "dinheiro limpo" na economia é realizada pelo lavador que, através das etapas anteriores, faz com que este dinheiro apareça como se tivesse sido ganho legalmente. Nesta fase, é muito difícil distinguir riqueza legal e ilegal.
    Métodos populares entre os lavadores nesta fase do jogo:
    1 - estabelecimento de companhias anónimas em países onde é garantido o sigílo. Eles podem então conceder empréstimos baseados no dinheiro lavado, que forma parte do capital da companhia, no curso de futuras transacções legais. Além disso, para aumentar os lucros, vão também reivindicar dedução de imposto nos reembolsos do empréstimo e dos juros que eles mesmos pagarão.
    2 - enviando falsas notas ou guias de exportação/importação e sobrefacturando os bens os lavadores conseguem movimentar o dinheiro de uma companhia e país para outro com as facturas que servem para confirmar e ocultar a origem do dinheiro colocado em instituições financeiras. (Este método pode ser usado também na fase de camuflagem).
    3 - um método mais simples é transferir o dinheiro (por Transferência Eletrónica) de um banco possuído ou controlado pelos lavadores para um banco internacional legítimo e "limpo". Esta operação é simples porque bancos off-shore podem facilmente ser comprados em muitos paraísos fiscais (veja secção sobre fraudes com bancos fantasmas).
    4 - existe toda uma série de operações imobiliárias, partindo de incorporações para chegar a simples operações de compra e venda de imóveis, que se prestam muito bem a operações de integração de recursos lavados. As autoridades sabem disso e por isso em vários países determinadas operações devem ser declaradas, obrigatóriamente.
    5 - o estabelecimento de vários tipos de actividades financeiras é também muito usado. Em particular são frequentemente apreciados, pelos lavadores, investimentos em financeiras (para fazer empréstimos) e em companhias de resseguros. Obviamente bancos e seguradoras são também interessantes. Empresas que se ocupam de trading de commodities são também apreciadas e ultimamente estão a ficar na moda.

    A maneira em que são executadas as etapas básicas descritas anteriormente depende sobretudo da disponibilidade de mecanismos e canais de lavagem e de brechas legais mas também depende das necessidades específicas das organizações criminais. Esta tabela fornece alguns exemplos típicos.
    Etapa da Colocação
    Etapa da Camuflagem
    Etapa da Integração
    Dinheiro depositado em banco (ás vezes com a cumplicidade de funcionários ou misturado a dinheiro licito).
    Transferência Eletrónica no exterior (frequentemente usando companhias escudo ou fundos mascarados como se fossem de origem licita).
    Devolução de um falso empréstimo ou notas forjadas usadas para encobrir dinheiro lavado.
    Dinheiro exportado.
    Dinheiro depositado no sistema bancário no exterior.
    Teia complexa de transferências (nacionais e internacionais) fazem com que seguir a origem dos fundos seja virtualmente impossível.
    Dinheiro usado para comprar bens de alto valor, propriedades ou participações em negócios.
    Revenda dos bens/patrimônios.
    Entrada pela venda de imóveis, propriedades ou negócios legítimos aparece "limpa".
    Esta é uma pequena selecção de sistemas usados para "limpar" o dinheiro sujo. Seria possível escrever sobre vários outros sistemas mas deve levar-se em conta que todos os esquemas sobre os quais se escreve, por definição, já foram descobertos e por isso estão, ou logo estarão, em desuso entre os criminosos. Com certeza muitos novos sistemas estão a ser usados agora sem ainda terem sidos desmascarados. Porém, estes esquemas "antigos", ou variantes inovadoras dos mesmos, ainda estão a ser usados em negócios dos quais ninguém desconfia e, embora as autoridades conheçam estes sistemas, poucas pessoas comuns os conhecem ou até mesmo tem acesso a este tipo de informação.
    ACTIVIDADES ECONÓMICAS MAIS ATINGÍDAS POR OPERAÇÕES DE LAVAGEM DE DINHEIRO

    BANCOS
    A atividade bancária está protegida por regulamentos e leis diferentes em cada país, entretanto o melhor método para lavar dinheiro continua a ser o de possuir ou controlar de alguma forma um banco. Mesmo sabendo que os bancos são um sector de risco em relação às funções principais deles (depósitos e abertura de contas), pouco pode ser feito contra este crime se o banco for operacional e os criminosos agirem em cumplicidade com seus accionistas, funcionários ou com um grande número de seus depositantes.
    Na maioria dos países, hoje, existem leis visando limitar e monitorizar as movimentações em dinheiro com a finalidade de detectar possíveis operações de lavagem. Tais leis, porém, precisam da colaboração e boa vontade dos bancos para serem eficazes e isso nem sempre acontece. Recentes casos de lavagem em vários países e em particular uma onda de casos no México envolvendo as filiais locais de grandes bancos internacionais (inclusive Americanos) provaram que é possível e, às vezes, até fácil, para quem, como os lavadores, dispõe de muito dinheiro, conseguir a colaboração de altos funcionários de bancos para que operações de lavagem sejam disfarçadamente veiculadas através de tais instituições e contrariamente ás leis vigentes. Este caso é, porém, bastante remoto por existirem leis específicas e controles em relação as instituições financeiras.

    SEGURADORAS
    Por ter como actividade institucional o recebimento de um prémio pequeno contra o possível pagamento de um valor grande em determinados casos, as seguradoras prestam-se muito bem a operações de lavagem de dinheiro. Obviamente para tanto é normalmente necessária a cumplicidade da seguradora ou o controle da mesma.
    Os esquemas típicos implicam no pagamento de sinistros indevidos (ou de outra forma "montados") e com valores altos, para dar uma origem lícita ao dinheiro. A seguradora por sua vez, para conseguir o dinheiro para o pagamento destes sinistros, é capitalizada através de contractos de resseguro com empresas resseguradoras sediadas em paraísos fiscais (ligadas ou controladas pelos criminosos) ou através de outros esquemas ainda mais elaborados. Este caso também é bastante remoto por existirem leis específicas e controles.

    FUTUROS
    A experiência do Reino Unido (mas também dos EUA) mostrou que o mercado de futuros é outra área aproveitada pelos lavadores de dinheiro para os seus esquemas. Por causa da natureza "anónima" das estratégias de trading, quase todos os correctores comercializam como "principals" e não no nome do cliente deles, a verdadeira identidade do beneficiário das operações não é conhecida publicamente. As operações com commodities são, normalmente, um jogo com "soma zero", o que significa que você só pode comprar se alguém quiser vender, e vice versa.
    Os lavadores aproveitam esta característica do mercado através de esquemas de compras e vendas casadas. Eles compram e vendem a mesma Commodity, perdendo pouco na operação (a comissão do corretor mais pequenas diferenças de preço). O pagamento do contracto que perde é feito com dinheiro sujo vindo de um lugar remoto e o ganho feito na bolsa de mercadorias é dinheiro limpo, cuja origem - um ganho de bolsa - eles podem justificar para qualquer fim, e que recebem legitimamente, através de uma empresa controlada, normalmente num país de primeiro mundo.

    EMPRESAS FINANCEIRAS E DE FACTORING
    Como acontece com os bancos, normalmente qualquer transacção suspeita deveria, por lei, ser comunicada às autoridades. No mundo inteiro, porem, não é raro ver empresas deste tipo controladas por grupos criminosos, que as usam tanto para as primeiras etapas da lavagem quanto para as sucessivas. Depósitos em dinheiro a favor deste tipo de empresas (para pagamento de dividas) são uma das maneiras mais frequentemente usadas para a "Etapa de Colocação", por isso é necessária uma vigilância especial por parte dos directores e funcionários destas empresas (quando eles não forem cúmplices, obviamente).
    Qualquer mudança incomum nos hábitos de pagamento de clientes regulares necessita ser investigada e os emprestadores também precisam prestar atenção sendo que técnicas de lavagem de dinheiro podem envolver uma devolução de um empréstimo mais rápida do que a renda ou os recursos disponíveis permitiriam. Normalmente é possível saber a renda declarada (ou capacidade financeira) de um cliente na acto do pedido para o empréstimo. Um caso á parte são, obviamente, empresas deste tipo que operam em cumplicidade com os criminosos ou controladas por eles.

    CASAS DE CÂMBIO E TRANSMISSORES DE DINHEIRO
    Casas de Câmbio / Transmissores Internacionais de Dinheiro / Agências de Viagens.
    Todos oferecem uma ampla gama de serviços que podem ser usados pelos lavadores de dinheiro. Passagens de companhias aéreas, Câmbio de dinheiro estrangeiro em forma de notas ou traveller cheques são técnicas bastante usadas. Existem serviços de transferência de dinheiro através de fax, ordem eletrónica, cheque ou "courier" que podem ser facilmente usados por pessoas que não podem usar os normais canais bancários (caso de muitos criminosos). O anonimato do cliente é uma característica primária de tais transferências o que mostra o nível inerente de risco.

    CASINOS, BINGOS E LOTARIAS
    Casinos e estabelecimentos/atividades de jogo em geral são particularmente atraentes para os lavadores de dinheiro. Dinheiro vivo pode ser depositado no casino em troca de "fichas" ou "moedas" para jogar (justificando assim grandes quantidades de dinheiro em espécie). Depois de algumas voltas à mesa, o jogador pode trocar o resto para um belo cheque que pode ser depositado na conta dele. Outro método é comprar em dinheiro bilhetes premiados de pessoas que apostaram numa instituição autorizada (lotarias, corridas de cavalos, concursos, etc...), dizendo depois que o lavador é quem ganhou. Isso, entre outras coisas, faz das lotarias e dos estabelecimentos de apostas actividades vulneráveis ao uso por lavadores. Para terminar é clássico o caso dos estabelecimentos de jogo controlados por lavadores de dinheiro que declaram ter embolsado 100 quando embolsaram só 10 (ninguém tem como averiguar se 10 ou 100 jogadores foram lá no dia) lavando assim 90 !!

    COMERCIANTES DE ANTIGUIDADES OU ARTE
    JOALHEIROS E COMERCIANTES DE PEDRAS PRECIOSAS
    COMERCIANTES DE ARTIGOS DE "DESIGN"

    Qualquer área que tenha as características representadas intrinsecamente por bens de alto valor, que possuam grande portabilidade e sejam usualmente pagos em dinheiro (ou possam sê-lo) é uma área atraente para os lavadores de dinheiro. Isso porque uma actividade deste tipo permite transformar dinheiro em espécie em algo fácil de transportar e com um valor e uma origem indefinidos, que portanto poderá muito bem ser revendido noutro lugar gerando uma nova origem e localização para o dinheiro. Todas as áreas indicadas no titulo desta secção satisfazem estes critérios e os donos destas actividades assim como os seus funcionários têm que prestar grande atenção ao exacto cumprimento das leis assim como a qualquer situação ou comportamento suspeito por parte de clientes e funcionários. Isso se eles quiserem evitar ser usados, sem querer, dentro um esquema de lavagem de dinheiro.
    Imaginem, por exemplo, que um lavador de dinheiro consigue adquirir em Portugal um quadro valioso pagando em dinheiro vivo. Ele poderá, sempre por exemplo, transportar este quadro para os EUA onde será vendido a um museu que pagará através de um deposito bancário numa conta do lavador nos EUA. Resultado: o dinheiro em espécie oriundo de actividade criminosa em Portugal ter-se-á transformado num deposito em conta nos EUA tendo como origem o pagamento de uma obra de arte por parte de um museu (nada mais cristalino !).

    COMPANHIAS AÉREAS E DE TRANSPORTE
    As companhias aéreas, assim como as de transporte de passageiros em geral, tem duas características que fazem com que sejam muito interessantes para lavadores de dinheiro. Primeiro mexem com muitos clientes cada um pagando valores medianamente elevados pelos serviços. Segundo não existe (ainda) uma maneira segura e confiável para monitorizar o volume de passageiros e consequentemente a origem dos fluxos financeiros destas empresas. Vamos fazer um exemplo prático (mesmo simplificado):
    Uma empresa aérea, cúmplice ou controlada por lavadores, tem um avião com capacidade para 200 passageiros. Numa viagem típica cada passageiro gasta digamos 400 € pela passagem. O avião faz em media 6 viagens por dia. Isso quer dizer que, dependendo da ocupação do avião, a empresa pode facturar, com este avião, de 0 até 480 mil €uros por dia, ou seja quase 14,5 milhões por mês. Digamos que a empresa viaje na realidade com 50% de ocupação ou seja facture pouco mais de 7 milhões por mês e declare, em vez disso, que está viajando com 100% de ocupação (depositando nas contas 7 milhões a mais em dinheiro dizendo que são os pagamentos das passagens) ... quem poderá dizer numa fiscalização que isso não é verdade ?? Neste caso eles terão lavado 7 milhões de €uros por mês, criando uma origem para o dinheiro sujo. O mesmo pode acontecer com uma frota de autocarros, de carros de aluguer etc...

    RESTAURANTES E COMERCIOS DE MASSA
    Restaurantes, discotecas, bares e outros estabelecimentos comerciais de massa deste tipo são um alvo típico de operações de lavagem. Isto porque ninguém tem condições de provar se o estabelecimento recebeu 10, 100 ou 1000 clientes (com respectiva facturação) e portanto a origem do dinheiro ilícito pode facilmente ser transformada em limpa declarando que foram atendidos 1000 clientes quando eram 100 ou 10.
    É obvio que para este fim é necessário que o estabelecimento seja conivente com os lavadores ... aliás em muitos dos casos onde um estabelecimento deste tipo foi envolvido em operações de lavagem de dinheiro descobriu-se que o dono era um criminoso (ou algum parente dele) e que o objectivo primário do estabelecimento não era servir os clientes mas sim lavar o dinheiro do criminoso. O principal cuidado a ser tomado para não ser envolvido em operações ilícitas, além de não aceitar propostas suspeitas em relação ao seu estabelecimento comercial, é o de não emitir notas "frias" ou documentos parecidos a favor de estabelecimentos deste tipo (o melhor é não nunca emitir e a favor de nenhum tipo de empresa) ... isso porque uma nota deste tipo poderá ser usada, por exemplo, por um restaurante para demonstrar que comprou ingredientes suficientes para servir 1000 clientes em vez de 10 e justificar portanto a consequente facturação.

    CONSTRUTORAS E IMOBILIÁRIAS
    O sector de construção e imobiliário em geral é um alvo clássico de operações de lavagem de dinheiro. São comuns as noticias de traficantes que aplicam os recursos ilícitos na compra de imóveis ou terrenos e/ou na construção. As operações imobiliárias oferecem um meio simples e eficaz para transformar dinheiro de origem ilícita num outro tipo de "património" conseguindo ao mesmo tempo disfarçar o verdadeiro dono e a origem dos recursos. Comprar um bem por um valor declarado menor (pagando a diferença em dinheiro) e depois vender pelo valor total oferece um outro meio de criar uma origem "limpa" para recursos ilícitos. Como em todos os sectores, as operações de lavagem no sector imobiliário podem ir de simples compras ou vendas, às vezes em nome de cumplices, sem maiores cuidados, até operações altamente estruturadas e complexas envolvendo entidades offshore e várias passagens para atingir resultados mais sólidos e/ou volumosos. O cuidado principal neste sentido é não aceitar pagamentos em dinheiro ou operações vindo de pessoas/empresas suspeitas e que não tenham como explicar a origem dos recursos.

    Este não é, nem quer ser, um elenco exaustivo das actividades a risco, porém, algumas das características "de risco" indicadas nesta página podem ser reconhecidas também noutras actividades não mencionadas. 

    OS PERIGOS AO SEREM ENVOLVIDOS

    Os perigos derivados do serem envolvidos em operações de lavagem de dinheiro, tanto voluntariamente quanto (é o caso mais comum) involuntariamente, são bastante evidentes.
    A lavagem de dinheiro é um crime em Portugal assim como praticamente em todo o mundo. Mesmo alguns dos mais flexíveis "paraísos fiscais" tem hoje alguma forma de legislação contra a lavagem de dinheiro de origem criminal (é o caso de Panamá, das Ilhas Cayman, Ilha da Madeira e Ilha de Santa Maria, etc...).
    As pessoas envolvidas em processos de lavagem de dinheiro podem ser suspeitas de serem cúmplices dos criminosos (traficantes, terroristas, assaltantes, sequestradores etc...). Serão possivelmente processados por estes crimes e/ou por outros ligados especificamente à lavagem do dinheiro. Para não serem condenados, deverão, no mínimo, demonstrar que eles não tem nada a ver com isso e que tomaram todas as precauções e medidas possíveis para averiguar a natureza das operações e a origem do dinheiro. Por isso é necessário seguir um processo de "due diligence" antes de se envolver em operações novas e/ou potencialmente suspeitas.
    Além dos riscos de serem envolvidos em actividades criminais existem outros riscos de ordem mais prática. O dinheiro de origem ilícita pode ser sequestrado ou bloqueado criando problemas económicos serios no caso de estar a ser usado para financiamento de empreendimentos (que ficariam também bloqueados).
    Pode-se ainda ressaltar o forte risco de imagem relacionado ao serem envolvidos em operações de lavagem de dinheiro, mesmo que involuntariamente. Pensem o que os mídia e a sociedade como um todo pensariam de uma empresa que, independente da sua boa fé ou menos, foi comprovadamente usada para lavar dinheiro de algum traficante de drogas. Duvido que exista alguma forma pior de publicidade.
    Para terminar, ser envolvido em lavagem de dinheiro quer dizer de alguma forma ajudar os criminosos. Ou seja fazer com que eles continuem na actividade criminal e tenham recursos para incrementar tal actividade. Isso é com certeza negativo para a sociedade como um todo.
    Em caso de duvidas peça a ajuda de profissionais confiáveis ou de instituições financeiras de reputação internacional. Procure identificar todos os envolvidos nas operações e assinar contractos por escrito com todos eles detalhando todas as características das operações. Não se esqueça de verificar, de forma independente e profunda, todas as informações que lhe forem fornecidas. Pelo menos poderá dizer que tomou todas as precauções necessárias e ao seu alcance.
    ALGUNS CUIDADOS A TOMAR PARA NÃO SER ENVOLVIDOS
    Os organismos internacionais concordam, em principio, sobre algumas práticas saudáveis para não se envolver em operações de lavagem de dinheiro. As principais recomendações são as seguintes:
  • Evitar operações de qualquer tipo com recebimentos em dinheiro (vendas, serviços, financiamentos etc...). Quando não for possível evitar alguns pagamentos em dinheiro, limitar o valor maximo de tais pagamentos a 5.000 €uros por dia e por grupo e evitar que tais pagamentos aconteçam com frequência e/ou regularidade. Favorecer SEMPRE recebimentos que transitem pelo sistema bancário (DOC, TEI, SWIFT, Cheque...).
  • Evitar realizar qualquer operação comercial ou financeira por conta de terceiros a não ser que seja totalmente transparente, justificada e sólida além de viabilizada ou executada através de canais bancários. Evitar operações com pessoas ou entidades que não possam comprovar a origem do dinheiro envolvido e que não sejam bem conhecidas.
  • Evitar operações por quantias elevadas que não tenham uma origem muito bem definida e um sentido econômico, comercial e financeiro sólido. Evitar operações suspeitas ou que apareçam "milagrosamente" e/ou que pareçam "boas demais".
  • Evitar operações financeiras internacionais complexas, que envolvam muitas movimentações de dinheiro em países diferentes e/ou entre bancos diferentes.
Para empresas de médio/grande porte é também útil (para não dizer fundamental) que sejam implantados os seguintes procedimentos:
  • Identificação de um responsável geral pelas políticas internas contra a lavagem de dinheiro.
  • Treino e responsabilização de todas as áreas sensíveis quanto aos procedimentos estabelecidos contra a lavagem de dinheiro.
  • Estabelecer um sistema de relatórios internos periódicos, relativos aos aspectos determinantes na luta contra lavagem de dinheiro (movimentações em dinheiro, fornecedores etc...).
  • Estabelecer um sistema de monitorização e de auditorias internas periódicas e independentes para verificar a aplicação dos princípios determinados e identificar áreas de risco ou vulnerabilidade.
Em caso de duvidas consulte sempre as referências bancárias e/ou as autoridades competentes. 
MEIOS E TÉCNICAS DE LAVAGEM CLÁSSICAS

Os meios e as técnicas de lavagem podem ser divididas em três grandes categorias ou âmbitos de aplicação pratica:
1)    Bancos
2) Instituições financeiras não bancarias
3) Empresas não financeiras.
Para cada categoria podemos resumir as principais técnicas como abaixo indicado:
1) Bancos
  • grandes depósitos e transferências.
  • contas com nome falso.
  • contas de amigos, parentes e cúmplices.
  • empresas de fachada, normalmente offshore, para estratificar transacções.
  • advogados, contabilistas, consultores, agentes fiduciários e trustees.
  • aquisição de bancos "limpos".
  • transferências telegráficas.
  • travelers cheques.
  • estruturação de operações financeiras (frequentemente eletrônicas) para evitar requerimentos legais.
  • acordos para "devoluções de empréstimos".
  • internet banking e contas eletrónicas de depósito.
  • cheques administrativos, letras de câmbio e ordens de pagamento.
  • depósitos e saques em dinheiro.
  • contrabando de dinheiro entre países.
  • transacções em dinheiro relativas a negócios.
  • contas de "captação".
  • contas de "pagamento".
 
2) Instituições financeiras não bancárias
  • casas de câmbio.
  • empresas de transferência de dinheiro.
  • travelers cheques.
  • bancos "impróprios", tipo os "hawala" e os "hundi" no Médio Oriente e Ásia.
  • seguros de vida com prémio único.
  • seguros de garantia ou outros seguros "financeiros".
  • serviços de correio (ordens de pagamento e pacotes contendo dinheiro).
 
3) Empresas não financeiras
  • facilitadores profissionais (advogados, contabilistas, tabeliões, agentes fiduciários, consultores financeiros, corretores etc...).
  • sistemas baseados na confiança e lealdade.
  • operações de trade através de "zonas francas".
  • casinos, apostas, sites internet de apostas e jogos.
  • construção e empreendimentos ou negócios imobiliários.
  • compra e venda/entrega noutro país de metais preciosos.
  • compra e venda/entrega noutro país de commodities.
  • compra e venda/entrega noutro país de produtos industriais de facil revenda.
  • operações comerciais de fachada utilizadas para justificar movimentações de dinheiro.
  • uso amplo de opções ou "warrants" no mercado de metais ou outras commodities.
  • em empresas reais - falsas facturas, mistura de dinheiro limpo e sujo, "devoluções" de empréstimos, "devoluções" de créditos comerciais, falsas declarações de import/export, disfarce de operações através de sociedades offshore.
 

Nenhum comentário:

Postar um comentário